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Fonte |
“-Sabe – diz ela –, existem algumas pessoas por aí que não esperam o que
virá a seguir. Elas decidem o que deveria vir a seguir e fazem com que isso
aconteça.
Silver dá um sorriso triste. Percebe que aquilo que não ensinou através
da sua sabedoria talvez tenha sido transmitido através da sua estupidez.
-Você tem razão. Acho que as coisas teriam sido diferentes se eu tivesse
sido uma dessas pessoas.
-Eu sou igual a você
-Você não é nada igual a mim.
-Sou, sim. Fico esperando que o universo decida coisas por mim, e a
questão é que o universo tem coisas melhores a fazer.
-Quando você se tornou tão inteligente?
Ela levanta os ombros.
-Lar desfeito. Você capta as coisas.” (Antes de
partir desta pra uma melhor, pág. 227)
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Fonte |
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Autor: JONATHAN TROPPER
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Título Original:
One Last Thing Before I Go
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Editora: Arqueiro
·
Ano: 2015
SINOPSE:
“Não
é preciso ser nenhum gênio para perceber que a vida de Drew Silver é uma
sequência de decisões equivocadas. Faz quase uma década que sua banda de rock
emplacou uma música, filha única de mãe solteira. Desde então, a banda se
separou, sua mulher o largou e Silver tem assistido a vida passar, tocando em
casamentos – quando aparece algum – e descontando os cheques cada vez menos
frequentes que recebe pelos direitos autorais de seu único sucesso.
Silver
então descobre que a ex-mulher está prestes a se casar de novo e que a filha
adolescente, Casey, está grávida. Para completar, depois de sofrer um derrame
que o deixa incapaz de controlar a língua e guardar para si o que pensa, ele
precisa de uma cirurgia no coração. Diante desse cenário, o músico fracassado
depara com a pergunta decisiva: será que vale a pena salvar uma vida tão mal
vivida?
Assim,
sob o olhar exasperado da família, ele toma a decisão radical de se recusar a
fazer a cirurgia e dedicar o pouco tempo que lhe resta a tentar consertar o
relacionamento com Casey e aproveitar a vida – mesmo que ela não dure muito.
Com
diálogos rápidos, irônicos e sagazes, Jonathan Tropper confirma sua habilidade
em retratar com humor e perspicácia o lado oculto da família moderna.”
Para desconhecedores do autor, a linha de escrita de
Tropper beira o trágico e é cômica, ao mesmo tempo em que uma série de
confusões intervêm num único acontecimento, transformando tudo, simplesmente,
no mesmo ponto central. Autor de “Como falar com um viúvo” e de “Sete dias sem
fim”, Tropper carrega nos momentos capazes de destroçar um coração, enquanto as
gargalhadas são mais fortes. O equilíbrio que ele obtém em sua narrativa é
absolutamente notável e as situações propostas por ele são tão verossimilhantes
que mesmo o leitor se pergunta se já não viu algo igual. Seus diálogos são
arrebatadores – não porque lhe levam à reflexão íntegra e contemplativa do
universo, na busca pelo entender humano em suas minúcias e insanidades – mas
porque Tropper é capaz de levar os sentimentos e angústias humanos a um nível
de simplicidade quase tangível: o que importa são as feridas e como curá-las.
Profundamente, ele é capaz de tornar a vida um conto bem-humorado, no qual
mesmo as desgraças são parte aceitável.
“E, algum dia, em breve,
vou descansar em paz. Mas, até que esse dia chegue, vou descansar em
frangalhos.” (Antes de partir desta pra uma melhor, pág. 198)
Em “Antes de partir
desta pra uma melhor”, o protagonista é Drew Silver. Um homem que acaba por se
descobrir à beira da morte e que tem pouco tempo antes que sua artéria se rompa
e ele parta desta pra uma melhor. Acontece que,
depois de todas as escolhas erradas e todos os momentos em que esperou, ao
invés de agir, fizeram com que ele decidisse que o melhor a fazer, simplesmente
é deixar que sua vida se vá. Ainda que uma cirurgia possa reverter seu quadro, ele
se nega a fazê-la e, nesse curto tempo de vida, ele decide que deve se ocupar
em seu um pai melhor para Casey. O que acontece no meio de toda essa trama? Um
emaranhado de fios soltos que, pouco a pouco, em um passo torto e
carregado de novos erros e confusões, acaba por se tornar um algo discernível.
A narrativa é toda bem estruturada e apresenta uma situação familiar não
resolvida que, muito cômica e realmente, se torna uma leitura divertidíssima e
bem humorada. Não é o tipo de literatura que apresente qualquer desafio mental
em linguagem e metáforas: é uma leitura suave, arrebatadora pelo seu ritmo
fluido e fácil.
“Tudo o que toco se
transforma em merda, pensa ele, não com autocomiseração, mas com um fascínio
quase científico.” (Antes de partir desta pra uma melhor, pág. 166)
Sempre com seu tom
de riso trágico, Tropper traz uma pontada de pensar ao
leitor, porque Drew é uma personagem perdida, que se esqueceu de si próprio e
de tudo o que o ronda depois que sua esposa o deixou. Não há mais o
brilho, a vontade e nem o instigar de quando se conheceram. E, agora, Drew
passa seus dias morando no Versailles – um local que passou a ser tachado como
um espaço para os homens deixados sós e que não mias encontram esperanças em
suas vidas – enquanto rememora seus dias de glórias que parecem ter ocorrido em
outra vida. O pontapé inicial para a mudança em sua vida vem na forma da
adolescente Casey, sua filha que o procura em busca de ajuda, uma vez que
descobriu-se grávida. A partir daí, todos os fios soltos de sua vida passam a
ser desafios diários que ele busca enfrentar, ainda que à sua peculiar maneira.
“Somos todos clichês,
pensa Casey, estamos todos seguindo roteiros que foram escritos e interpretados
muito antes de conseguirmos aquele papel.”(Antes de partir desta pra uma
melhor, pág. 150)
Como o são, este é mais uma obra de Tropper que
busca mostrar a tragédia das coisas no melhor lado do humor, levando algumas
gargalhadas profundas do público leitor. Ainda que se utilize de termos e
vocabulário de teor malicioso e/ou palavrões, a narrativa não se mostra
mastigada e jogada ao leões famintos: é parte do estilo do autor, que narra em
simplicidade e de forma coloquial, um ambiente divertido, trágico e irônico.
“Estamos envelhecendo,
pensa ele, nos desintegrando célula por célula a um ritmo alarmante” (Antes
de partir desta pra uma melhor, pág. 103)
A capa do livro, na tonalidade vermelha como
predominante, chama logo a atenção e as figuras nela contida (sutiã, garrafa de
bebida e coração) retratam sucintamente alguns percalços e situações pelas
quais Drew passará durante seu fim de estadia na vida. Com uma interessante
clareza, Jonathan Tropper trabalha o universo masculino com uma sensibilidade
difícil de se observar, que sempre é bem retratada em suas neuroses, temores, erros
e arrependimentos, criando uma atmosfera única e emocionante. O autor consegue
ir um pouco além quando eleva a dor a ponto de fazer com que os questionamentos
– acerca de questões cotidianas e familiares – se torne algo quase palpável.
Isso porque – na busca pelo aceitar em salvar a vida de Drew – as outras
personagens acabam por sensibilizar o leitor, vendo-se nelas mesmas. E sem
deixar o humor de lado, o que torna a narrativa ainda mais curiosa.
“É incrível, pensa, como
o amor pode se tornar gasto e sujo.” (Antes de partir desta pra uma
melhor, pág. 121)
Quer
saborear um breve trecho? Então, dê uma olhada bem aqui.
Oi, tudo bem?
ResponderExcluirLi esse livro em 2015 e me lembro que não gostei muito. Achei a narrativa um pouco arrastada e não consegui me identificar muito com o Silver. A personagem que salvou o livro foi Casey, na época eu a tinha achado adorável.
Beijo.